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O cooperativismo e a nova ordem econômica, por Ênio Meinen*

20/03/2017
A cooperativa de crédito não é um negócio financeiro ordinário

“A cooperativa de crédito não é um negócio financeiro ordinário… É a expressão no campo da economia de um ideal social elevado.” (Alphonse Desjardins, líder-precursor do cooperativismo financeiro na América)

 

No empreendedorismo cooperativo o fim social se confunde com os desígnios econômicos. Tal reunião de propósitos – uma espécie de “dois em um” – foi bem traduzida pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em seu pronunciamento na cerimônia de abertura do evento Rio Cooperativo 2.000: “a cooperativa, como uma empresa, caracteriza-se por aliar diretamente, na mesma organização cooperativa, dois aspectos fundamentais do desenvolvimento sustentável: a racionalidade econômica e o sentido da solidariedade social. Um híbrido de empresa e organização do terceiro setor, uma empresa com coração.”

 

Em vista disso, as cooperativas são empresas reconhecidamente comprometidas com o seu público (cooperados) e respectivas comunidades. Representam, assim, arranjos peculiares, constituindo o modelo precursor e o cerne do que se convencionou chamar atualmente de economia colaborativa, compartilhada ou ainda de rede, prestigiada e difundida ao redor mundo.

 

As novas formas de empreender apresentam, com efeito, um conjunto de características convergentes com a doutrina e a prática cooperativistas, destacando-se:

 

1) a comunhão de interesses de uma coletividade de pequenos empreendedores;
2) o intercâmbio de soluções por meio da ajuda mútua (ex.: quem tem empresta, mediante expectativa de justa remuneração, para quem não tem);
3) o desenvolvimento pela soma de esforços e não pela competição (construção conjunta: “a união faz a força”);
4) a ausência de hierarquia entre os empreendedores (propriedade comum, com gestão democrática);
5) a flexibilidade e a busca de soluções personalizadas e tempestivas de acordo com a demanda dos usuários;
6) a autonomia e empoderamento dos destinatários das soluções (usuários/cooperados no centro das decisões);
7) a transparência na condução dos empreendimentos;
8) o compartilhamento de estruturas e de outros recursos, otimizando investimentos, reduzindo impactos ambientais e gerando economia para os usuários;
9) o partilhamento dos resultados.

 

A reputação e a confiança são outros dois aspectos-chaves comuns a ambas as iniciativas. Daí, também, a legitimidade e a conveniência do emprego das locuções: economia da cooperação ou economia da mutualidade.

 

O consumidor também vem tornando-se mais seletivo, acentuando a busca de motivações para as suas escolhas. Cada vez mais, as pessoas têm procurado identificar organizações que tenham uma causa ou que defendam uma bandeira do bem. O protagonismo na formatação das soluções e na sua precificação é outro anseio que cresce, progressivamente, entre os usuários. Ora, o cooperativismo, como uma causa do bem e que reúne em um mesmo ator os papéis de empreendedor e consumidor (proprietário e usuário) – eliminando o intermediário -, acolhe, legitimamente, as expectativas da nova sociedade.

 

Em síntese, nas palavras de Robert J. Shiller (Nobel de Economia em 2013), “o movimento cooperativo constitui uma inovação essencial para uma boa e nova sociedade. É, portanto, uma iniciativa sempre atual para esse propósito, uma vez que, embora reconheça a livre iniciativa, não tem o lucro como objetivo.” Arrematando, sentencia: “cooperativismo é sinônimo de boa sociedade.” (Segunda Cúpula Mundial do Cooperativismo. Quebec, Canadá, 7 de outubro de 2014).

 

*Ênio Meinen, advogado, pós-graduado em direito (FGV/RJ) e em gestão estratégica de pessoas (UFRGS), e autor/coautor de vários artigos e livros sobre cooperativismo financeiro – área na qual atua há 33 anos -, entre eles a obra “Cooperativismo financeiro – virtudes e oportunidades: ensaios sobre a perenidade do empreendimento cooperativo” (referência para este artigo). Atualmente, é diretor de operações do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob).

 

Fonte

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